Sexta Semana da Canção Brasileira



É com imensa alegria que anunciamos a Sexta Semana da Canção Brasileira. Uma edição que, hoje, nos provoca muitos questionamentos e reflexões, afinal...

Pausa.

Esta seria a abertura do texto que publicaríamos alguns dias atrás. No entanto, sofremos um duro golpe, fruto dos tempos incertos que atravessamos. Registramos, com profundo pesar e incredulidade, a passagem de um grande músico, presente em todas as edições da Semana, dentro e fora dos palcos: Nhô Frade. A partida dele foi dolorosa e inesperada. A Sexta Semana da Canção Brasileira mudou de eixo com esta perda basilar para sua cidade e história. Ela será dedicada à memória deste grande multi-instrumentista e divulgador da música de onde nasceu. Um dos fundadores do grupo Paranga, hoje atuava em quase todas as bandas luizenses; cidadão querido, figurinha fácil pelas ruas, praças e palcos de São Luiz do Paraitinga. A Nhô Frade, nosso respeito, nossa homenagem.

O que nos move nestes tempos tão difíceis, em que, confinados em nossas casas, assistimos ao mundo de janelas/telas, ambas as palavras em sentido duplo? A realidade reduzida e filtrada, o pensamento que nos chega editado, curto, como se o mundo, restringido, só conseguisse nos ofertar uma gota espremida ao invés da caudalosa corrente de um rio de possibilidades?

O que nos toca, para além do ilusório mundo das imagens e das palavras jogadas ao léu, como se o planeta tivesse se transformado num repositório de letras soltas, de quadradinhos coloridos desprovidos de significado e valor?

A memória se revela o mais eficaz antídoto para este momento. Através dela recuperamos nossa humanidade, afetividade, história. A cultura. Neste cenário desolador, a cultura emerge em todo seu esplendor, dentro de cada um de nós. Somos nossa história, somos nossa trajetória.

Visualizo um Brasil onde cada habitante carrega um Brasilzinho dentro de si, com suas músicas, sua natureza tão bela e diversa, seus mistérios de América do Sul portuguesa, negra e índia. Único e singular, sem raça ou rosto definido. O povo brasileiro. Sua música, tão transversal, tão rica, uma explosão de criatividade que se reduz a uma canção qualquer, aquela que nos toca e nos move.

É aqui e agora que acontece a Sexta Semana da Canção Brasileira, uma reflexão sobre a canção popular mais poderosa do mundo, porque diversa, múltipla e sem rosto – ou melhor, diversa e múltipla em vários rostos. Somos a canção popular brasileira. Ela nos dá voz. O sentido maior de nossas vidas, a cultura, a música, nos transforma, nos dá alento, nos projeta ao infinito.

No momento em que somos privados da convivência, temos a voz cantante, a memória de festas, dos corpos gingando, das celebrações de fé, de tambores ressoando, ritmo, sons... assim, de volta a nossa casa, de volta às nossas origens, nos confortamos, ganhamos sentido. É sobre essa volta que celebramos a Sexta Semana, um pensamento sobre história, educação e letra e música na canção popular brasileira.

Ainda que aparentemente reduzida e confinada a quadradinhos coloridos, ela nos dará a chama necessária para o despertar da memória que nos une e nos motiva.

Teremos um festival revelador de novos compositores, pois a veia criativa da canção não seca nunca. Teremos, também, apresentações de quatro grandes e jovens criadores já consagrados da canção popular contemporânea. E, dando continuidade à Semana como um todo, desta vez colocaremos a cidade de São Luiz do Paraitinga em maior evidência, com igual número de nomes contratados – quatro exemplos contundentes da excelente música popular feita na diminuta grande cidade do Vale do Paraíba. Por fim, aulas e conversas com quem estuda e pensa história e educação em canção popular, desta vez abertas ao público em geral.

Sim, porque para além do que nossa visão alcança, o mundo virtual também escancara mais janelas, em outros lugares, abrindo possibilidades com as quais não sonhávamos – pessoas do mundo inteiro podem acessar e assistir ao Festival, aos shows, às aulas.

Enquanto tudo acontece, aprendemos a lidar com a tecnologia virtual que se descortina para os novos mundos. E aprendemos, paradoxalmente, a nos voltarmos para o essencial que nos toca e move: a cultura e, muito especificamente no caso do Brasil, a canção popular. O Brasilzinho de cada um.

Agradeço a produção incansável de Gisele Jordão e Renata Allucci, pois foi através da persistência e idealismo delas que conseguimos materializar esta edição da Semana. Desta vez, com mais um companheiro igualmente idealista e – graças! -, tecnologicamente mais apto que nós, o Leonardo Birche. Agradeço a assessoria de Sergio Fogaça, presente nas seis edições.

Agradeço sobretudo ao trabalho de bastidores de Filipe Magalhães, o Figão. E a André Magalhães, desde sempre diretor do som dos palcos, o parceiro de todas as horas, o amigo silencioso e querido.

Agradecemos a cidade de São Luiz do Paraitinga, nossa musa inspiradora, exemplo do Brasil que queremos e amamos, onde a fé, a cultura e a ciência andam de mãos dadas. Afinal, é a cidade natal do sanitarista Oswaldo Cruz, exemplo de bom combate pela saúde de nosso país.

Que possamos celebrar muito, virtualmente!
Nhô amado, esta festa é em sua memória.

Suzana Salles